quarta-feira, 25 de maio de 2011

Uma coisa te falta

"E Jesus, olhando para ele, o amou e lhe disse: Uma coisa te falta; vai vende tudo quanto tens e dá-o aos pobres, e terás um tesouro no céu; e vem, segue-me. Mas ele, pesaroso desta palavra, retirou-se triste, porque possuía muitos bens" (Mc 10.21,22)


Ah, incompreensível amor que olha, vê a falta e ainda assim ama! Os muitos tesouros desse (pobre) jovem rico não o fizeram amado, tampouco sua posição social o credenciou ao compassivo olhar do Salvador. Sua boa conduta não preencheu aquela parte lá dentro, sempre em penúria, e seus bolsos cheios não condiziam com seu coração. Certamente as riquezas lhe garantiriam uma vida confortável até seu último suspiro - mas... e depois? Como seria depois? Como faria para herdar a vida eterna?

Bom Mestre, corro em Tua direção, diante de ti me ajoelho. Tenho sido pleno em tudo, tenho atingido todas as metas desde a infância, eu realmente me dedico àquilo que faço. Diga-me o que fazer para herdar a vida eterna. Diga-me apenas, e eu darei um jeito de executar o serviço!

Jovem, ninguém repara, ninguém percebe, mas falta-te uma coisa. Existe um vazio camuflado por trás de teus bons desempenhos, mas o santo olhar de luz sabe que uma lacuna está ali. E a despeito de tua meia vida, o Mestre tem amor e compaixão por ti. Não faz sentido ser amado por Aquele cujo olhar vai além da superfície dourada e oca dos bons comportamentos, mas Ele conhece e apesar disso ama. Diante dele, tu, que nunca viste a ti mesmo como débil ou devedor, tão cercado de teus créditos, tão rodeado de teus atestados de sucesso, descobres que falta-te algo.

Não, não te ofendas, nem te escandalizes com isso. O Mestre não revela tuas faltas para humilhar-te; pois, na verdade, o foco de tudo isso não é a revelação da miséria humana, mas, sim, o descortinar do divino e grandioso amor - que mais e mais se avoluma a fim de precipitar-se sobre teu vazio.

Hoje Ele olha para ti, e falta-te uma coisa. Outros podem atestar que és completo e íntegro, mas o Mestre te ama, por isso aponta a tua falta. Movido pelo sentimento mais sublime, revela o estado mais deplorável. Portanto, não permitas que aquilo que sempre te deu a ilusão de seres capaz te incapacite de seguires a Cristo. Ele sim é o nosso tesouro, Ele sim a infalível garantia, Ele mesmo a vida eterna, Ele só a permanente alegria!


"Ele é tudo para mim
Ele é tudo para mim
Ele é o tesouro que eu tenho
Guardado em meu peito
Ele é tudo para mim"

terça-feira, 17 de maio de 2011

Gratidão ao fim do dia

Anoiteceu, depois que várias horas pingaram no oceano do tempo. Deito-me na cama e sinto-me velho navio que, após ser surrado por tanta onda contrária, finalmente atraca em porto sossegado e pacífico. Neste fim de dia, minha única preocupação não são as ondas que voltarão a bater contra meu casco amanhã de manhã. Preocupo-me sobretudo em encontrar as palavras seletas, palavras dignas que possam ser dirigidas a Ti, meu Senhor, por teres me conduzido por águas turvas e perigosas, por teres feito Teu caminho de paz em meio a vendavais furiosos e recifes conspiradores, santo caminho que rasgou a espuma e abriu um sorriso em alguém que sabe que algo muito bom aconteceu, sem contudo saber explicar como ou o quê.

Lanço meu simples anzol à procura de palavras de agradecimento que naveguem em meu vocabulário, mas logo descubro que todas elas são peixinhos pequeninos demais. Não tenho alternativa senão fazer como aquele menino com sua pequena pescaria: entregá-la nas mãos de Jesus, que pode muito bem multiplicar e encher minha rede de farta alegria pelo Deus que rege os mares – os meus dias revoltos.

Aconchego-me na cama. Meu Senhor dá-me um sono reparador, de modo que o casco deste navio é consertado enquanto durmo. Seu amor e cuidado tão detalhista me enchem de sentimentos e decisões de retribuição, espontaneamente. Já em terra firme, meus pensamentos se aproximam e me perguntam o que fiz ou de que maneira escapei. Velhos marujos interrogam-me se pensei em lançar fora a carga durante a tempestade. Não, meus amigos, eu nunca poderia me desfazer desta carga, pois embora a carregue em meu navio, Ela vale mais que a embarcação inteira! Na verdade, é ela que me estabiliza, tesouro incalculável que preciso levar comigo. Se a lançasse fora, eu afundaria imediatamente, pois a carga preciosa é o Evangelho depositado em nós por Cristo, mais essencial que o próprio mar!

Portanto, que em todos os meus suspiros de alívio, que em todos os sorrisos de agradável espanto, que em todos meus prazeres e benefícios, eu possa sempre reconhecer, facilmente, unicamente, que és o Senhor e provedor, o amigo que não descansará enquanto não cumprir aquilo que, em Sua sabedoria mais que perfeita, sabe ser o melhor para este pequeno navio de frágil estrutura, segundo Sua livre vontade e Seu fiel amor.

Anoiteceu, uma vez mais. É noite, mas estou seguro, bem amarrado a Ti, cujos olhos cálidos e sinceros são o porto onde esta alma repousa segura, em noturna e silenciosa gratidão.

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Choro (aos Teus pés)

Choro
Não porque chorar é poético
Mas porque chorar é preciso
Porque chorar também é útil
Ainda que doa
E porque não vai doer menos
Se eu não chorar

Choro
Porque nas virgens fontes da alegria
Descobri pouca água e muito cloro
Porque todo botão de flor
Tornou-se fugaz e inodoro
Porque hoje é um belo dia
E eu ignoro – e me devoro

Choro
(choro muito mesmo)
Porque não sei quando voltarás
Nem a que horas, nem como…
Choro porque não Te vejo a sorrir
Logo Tu, que és meu ozono

Choro
(choro sozinho)
Porque às vezes tenho receio
De que esqueças que Te adoro
Que Te suspiro por cada poro
Sim, é por essas e outras que choro

Mas Te espero, ó Deus meu…
Volta!
Aos Teus pés agora moro.

"...ao coração quebrantado e contrito não desprezarás, ó Deus" (Salmo 51.17)